Efeito Slott: a maldição dos fãs que nunca estão satisfeitos
Após alguns bons anos observando o comportamento dos fãs, eu desenvolvi, de forma informal, sem nenhum tipo de pesquisa científica, a ideia do “Efeito Slott”. Basicamente é um fenômeno comportamental que atinge os fãs, ou talvez mais precisamente os leitores que não leem as HQs, em que eles vão reclamar da história, independentemente do que o autor faça.
Trago a seguir um exemplo muito claro de “Efeito Slott”, e que vai justificar de forma bastante simples o motivo de o roteirista ter “emprestado” o seu nome.
O contexto para o Efeito Slott
Em 2007 a Marvel causou uma enorme polêmica com o Homem-Aranha. O personagem estava casado, com um emprego fixo que pagava bem e ao que tudo indicava em breve poderia ter uma filha. Porém, o editor-chefe na época, Joe Quesada, junto com outros escritores, decidiu promover a história One More Day (Um dia a Mais), que mudaria radicalmente a vida do herói.
O casamento de Peter e Mary Jane foi cortado da cronologia, dessa forma nas histórias seguintes tivemos um Homem-Aranha “raiz”. A mudança foi realizada sob o argumento de que o personagem precisava voltar ao básico para refletir novamente o perfil dos fãs.
Peter Parker então voltou a ser um pobre miserável fodido, que não tem dinheiro para nada e que se dá mal em tudo. Na vida profissional, na vida pessoal e até na amorosa. E para contar essas histórias foram chamados diversos escritores e autores muito bem vistos, na arte, por exemplo, tínhamos Steve McNiven, Phil Jimenez e John Romita Jr..
Só que a iniciativa que deveria agradar os fãs, saiu pela culatra. A grande maioria começou a criticar a editora, focando as reclamações no idealizador do acontecimento: Joe Quesada.
Os vídeos abaixo, foram postados no Youtube em 2007, na época em que a HQ foi lançada. Pela reação dos fãs é possível ter uma noção do que eles pensaram sobre esse retrocesso:
https://www.youtube.com/watch?v=9u0S3HuCMrg
Até então, a reclamação é justa, pois o herói vinha em um crescimento, amadurecimento pessoal e isso tudo foi cortado e jogado no lixo, para que se desenvolvesse uma regressão do Peter. Veja bem, não se trata de Um Dia a Mais ser uma história boa ou não, ou se a fase anterior do escritor J.M. Straczynski era muito boa ou muito ruim. A questão é o retrocesso.
Um dos roteirista que escreveu o Homem-Aranha nessa nova fase foi Dan Slott, ele revesava os arcos junto de Zeb Wells, Bob Gale, Marc Gurggenheim, Joe Kelly e Mark Waid. Mas em 2011 Slott passou a ser o único roteirista de Espetacular Homem-Aranha.
O roteirista então não demorou muito para colocar a sua marca na revista. De imediato fez o Peter deixar de ser um perdedor, colocando-o para trabalhar nos Laboratórios Horizonte, onde poderia desempenhar todo o seu lado cientista e ainda ganhar bem.
A vida amorosa passou a dar frutos, com ele iniciando um relacionamento com a policial forense Carlie Cooper. Já no cenário pessoal, passou a reatar amizade com Harry Osborn e Flash Thompson, além de ganhar um “padrasto“, John Jonah Jameson Sr., pai do polêmico jornalista, que casou com a Tia May.
Para contextualizar o leitor: Um Dia a Mais foi em Epetacular Homem-Aranha 545. Slott passou a escrever a revista sozinho no capítulo 648. E a sua “paz” durou até a edição 700, quando ele publicou uma das mais polêmicas histórias do Homem-Aranha.
Em Espetacular Homem-Aranha 700 o Dr. Octopus troca de corpo com o Homem-Aranha e Peter acaba morrendo no corpo do vilão. A fase durou um pouco mais de 1 ano, gerou um rebuliço ENORME na internet, mas também vendeu muito e foi tremendamente elogiada. Mas obviamente tudo voltou ao normal.
Slott também tomou outras decisões polêmicas, as quais não iremos citar aqui, você pode ler no nosso texto com as 5 controvérsias de Dan Slott que causaram a ira dos fãs.
Em 2015, junto da iniciativa Totalmente e Diferente Marvel, Slott colocou o Peter em um status que ele ainda não havia alcançado. Quando Otto Octavius estava no corpo de Peter, ele fundou a Corporação Parker e após eles se separarem, o Amigão da Vizinhança seguiu tocando a empresa e a levou a se tornar uma das maiores companhias de tecnologia do mundo.
Nessa fase ele finalmente ficou rico e teve sorte na vida. Passou a namorar a Harpia, trabalhava em conjunto com a SHIELD, fundou uma organização beneficente com o nome do Tio Ben. Contratou o Gatuno para se passar por Homem-Aranha de vez em quando, para ninguém suspeitar da sua identidade secreta e também aprimorou o seu uniforme.
Em resumo: uma baita evolução para o herói. E foi um trabalho desenvolvido ao longo de 4 anos, desde a entrada de Slott como roteirista fixo, colocando-o para trabalhar nos Laboratórios Horizonte, até ele fundar a própria empresa. Não foi nada subido ou repentino.
Enfim: o Efeito Slott
Bom, aí que entra o “Efeito Slott”. Se os fãs reclamaram lá atrás que houve retrocesso em One More Day, era de se esperar que estivessem apoiando e curtindo esse período, né? Achou errado.
Por mais que muitos leitores tenham gostado da novidade e entendido a ideia de progressão, ainda teve bastante gente utilizando a “zona negativa” de “sites especializados” para promover o seguinte discurso:
Bom, se antes a reclamação era quanto ao retrocesso, agora passou a ser sobre a progressão. E esse é o “Efeito Slott”. Não interessa o que o autor faça, não agrada os leitores.
Dan Slott anunciou essa semana que está de saída das histórias do Homem-Aranha, após 10 anos escrevendo o personagem. Sua nova casa agora será a revista do Homem de Ferro. E após toda a progressão que ele realizou com o personagem, como será que foi a reação dos fãs ao anuncio da despedida? Vejam vocês mesmos:
Aqui, como editor do site, faço um parenteses para dar um pitaco: tem gente aí em cima desejando que ele saia da Marvel pois desgostou do que ele fez com o Homem-Aranha. Mas o grande trabalho do Slott foi em Surfista Prateado, revista que lhe rendeu prêmios, indicações e tudo o mais. Seria interessante o pessoal ler essa HQ também, pra poder julgar melhor o trabalho dele e não ser ofensivo, ofendendo inclusive a pessoa dele.
A fase do Homem-Aranha rico não foi um fracasso de vendas nem nada do tipo. Pelo contrário, vendeu bem e foi uma das revistas com os números mais regulares no catálogo da Marvel.
Mas, pelo peso do herói e pela novidade, esperava-se mais. Estamos falando de um mercado onde mensalmente temos 6 revistas do Batman entre as 10 mais vendidas, é de se esperar que uma HQ do Homem-Aranha que traga essa novidade possa rivalizar com o Cavaleiro das Trevas … mas não foi o caso.
A solução foi “voltar ao básico“, retroceder, uma vez mais. E também já tem gente reclamando. Só que, como ele recém começou a trabalhar no novo emprego, o pessoal ainda não tem muito o que falar mal.
A Marvel ainda não anunciou quem será o novo escritor do Homem-Aranha e nem fazemos ideia de quais novidades ele trará para o herói. Mas já torcemos com antecedência que ele não seja vítima do Efeito Slott, o que fará os fãs reclamarem de qualquer coisa que ele fizer.
